Se você é fã de euros pesados e já se aventurou nos quebra-cabeças engenhosos de Vital Lacerda, provavelmente já ouviu falar de On Mars. Considerado um dos jogos mais complexos e ambiciosos do designer português, On Mars é um convite para construir, explorar e sobreviver no Planeta Vermelho. Mas será que ele é tudo isso que dizem? Após algumas partidas intensas e reflexivas, trago minha experiência — e uma análise profunda — para te ajudar a decidir se esse título merece um lugar na sua mesa.
Primeiras Impressões: Expectativa nas Alturas
Eu me lembro bem da ansiedade ao abrir o Kickstarter de On Mars. Depois de jogos como The Gallerist, Lisboa e Kanban, esperava algo revolucionário. Para mim, este era o “Led Zeppelin IV” de Lacerda — um clássico instantâneo. Mas confesso: minha primeira partida foi um tanto frustrante.
Era um jogo com três jogadores, demorou cerca de 4-5 horas e foi um festival de paralisia analítica. Apesar das mecânicas complexas e da interação promissora entre jogadores, eu senti falta daquele “gancho” especial que caracteriza os jogos do designer. A movimentação entre a órbita e a superfície, que parecia tão inovadora no papel, não teve o impacto que eu esperava.
Ainda assim, guardei o jogo na coleção. Talvez fosse questão de dar mais uma chance — e foi o que fiz, anos depois, com meu sobrinho fã de jogos estratégicos. O que descobrimos mudou completamente minha visão do jogo.
A Premissa: Sobrevivência em Marte
Em On Mars, você assume o papel de um astronauta pioneiro, responsável por ajudar a construir uma colônia autossustentável no Planeta Vermelho. Para isso, será necessário:
- Gerenciar recursos essenciais como água, oxigênio e energia.
- Construir infraestruturas como estufas, minas e abrigos.
- Expandir sua colônia, equilibrando eficiência e planejamento estratégico.
O jogo é dividido em duas fases:
- Fase de Colonização — Você realiza ações como construir prédios, desenvolver tecnologias ou explorar o terreno com seu rover.
- Fase do Ônibus Espacial — Os jogadores podem se mover entre a órbita e a superfície, acessando diferentes ações.
Tudo isso enquanto compete por Pontos de Oportunidade (OP), necessários para vencer o jogo. Mas atenção: cada decisão importa, e o menor deslize pode comprometer sua estratégia.
O Desafio Mecânico: Complexidade Elevada
On Mars não é um jogo para iniciantes. Desde a primeira jogada, é evidente que dominar suas nuances exige paciência e dedicação. Aqui estão alguns destaques mecânicos que tornam o jogo tão único (e desafiador):
1. Dualidade Órbita-Superfície
A mecânica de alternar entre a estação orbital e a superfície marciana é central. Em órbita, você coleta tecnologias e recursos essenciais. Na superfície, constrói e expande sua colônia. No entanto, o timing dessa troca é crucial e pode definir o sucesso da sua estratégia.
2. Cadeia de Recursos
Cada construção depende de outra: água alimenta as plantas, que produzem oxigênio, que sustenta colonos. Essa interdependência exige planejamento impecável, e pequenos erros podem causar grandes gargalos.
3. Ações Executivas e Estratégia Longo-Prazo
Além das ações principais, o jogo oferece ações executivas que permitem combos poderosos — se bem utilizadas. Porém, durante minhas primeiras partidas, fui totalmente dominado pela opacidade dessas mecânicas. Só nas jogadas subsequentes comecei a enxergar o potencial estratégico do sistema.
A Experiência de Jogo: Evolução com o Tempo
O momento de virada para mim foi a terceira partida, jogada em dupla com meu sobrinho. Foi ali que o jogo On Mars realmente “se abriu”. As escolhas começaram a fazer mais sentido, e a tensão de competir por recursos e ações ficou evidente.
Jogando com dois jogadores, a experiência é mais fluida e menos punitiva em relação à ordem de turno. As opções táticas se destacam, permitindo um foco maior na execução das estratégias de longo prazo. E o melhor: quanto mais você joga, mais percebe a profundidade estratégica escondida no jogo.
Componentes e Produção: Uma Obra de Arte
Se existe um aspecto de On Mars que é indiscutível, é a qualidade da produção. Desde a arte impressionante de Ian O’Toole até os marcadores detalhados, tudo no jogo exala luxo e cuidado. O tabuleiro central é funcional e imersivo, com cada detalhe contribuindo para a sensação de estar em Marte.
A única ressalva é o custo. O jogo é caro, e a complexidade pode afastar quem busca uma experiência mais leve ou acessível.
Prêmios e Reconhecimento
Não é à toa que On Mars ganhou uma coleção de prêmios e nomeações, como o Golden Geek de Melhor Arte e Apresentação em 2020. Ele é frequentemente lembrado como um dos jogos mais belos e desafiadores de sua geração.
Vale a Pena?
Se você gosta de jogos desafiadores, tem experiência com euros pesados e não se intimida por uma curva de aprendizado íngreme, On Mars é uma obra-prima que vale a pena explorar. Ele recompensa o esforço com partidas memoráveis e um quebra-cabeça estratégico que se torna mais satisfatório a cada jogada.
Por outro lado, se prefere experiências mais diretas ou partidas rápidas, este não é o jogo para você. On Mars exige tempo, dedicação e uma boa dose de paciência.
Conclusão
On Mars não é apenas um jogo; é uma jornada. Minha experiência foi de frustração inicial, seguida por uma revelação que só veio após várias partidas. Hoje, ele ocupa um lugar especial na minha coleção e certamente estará na mesa sempre que eu quiser um desafio de verdade.
Seja você um explorador experiente ou apenas alguém curioso para desbravar Marte, este título de Vital Lacerda é uma oportunidade imperdível de testar seus limites estratégicos.
Olá, eu sou Pedro Henrique Schunz e tenho uma profunda conexão com os jogos de tabuleiro. Desde nossos primeiros encontros com clássicos familiares até as noites emocionantes de partidas estratégicas com amigos, cada dado lançado e cada carta virada moldaram nossa experiência única. Crescemos com os jogos, aprendemos com eles e, ao longo do caminho, construímos memórias inesquecíveis.