Se você, como eu, já apoiou dezenas de campanhas no Kickstarter, sabe da expectativa que é acompanhar cada atualização, imaginar o jogo chegando na sua porta, abrir a caixa e sentir aquele cheirinho de manual novo. Foi assim com Adventures in Neverland. A promessa era instigante: uma jornada narrativa na Terra do Nunca, com personagens clássicos, decisões ramificadas e produção caprichada. Mas no lugar da empolgação, veio um silêncio ensurdecedor.
Essa semana, a 2 Tomatoes Games — uma editora espanhola respeitada, que já trouxe títulos incríveis como Root, Hanamikoji e Karak — soltou um comunicado sincero e preocupante: não haverá versão em espanhol ou francês de Aventuras na Terra do Nunca. O motivo? Simples (e ao mesmo tempo grave): a editora original, a holandesa Black Box Adventures, sumiu. Isso mesmo — segundo a 2 Tomatoes, não há resposta há meses.
E aqui entra minha experiência pessoal como redator e entusiasta de jogos: já vi projetos darem errado, atrasos por motivos logísticos, até mesmo mudanças de escopo… Mas abandono editorial com contrato assinado, layout feito e tradução pronta? É de cair o queixo.
Neste artigo, vou destrinchar tudo que está por trás dessa treta editorial: as consequências para a comunidade, os problemas legais, a falta de transparência — e o que podemos aprender com mais esse capítulo conturbado do financiamento coletivo nos jogos de tabuleiro.
A Promessa Que Não se Cumpriu: O Caso 2 Tomatoes e a Quebra de Confiança
Imagine estar meses trabalhando na localização de um jogo: revisando regras, adaptando narrativas, fazendo layout e tradução com cuidado para manter a essência do original. Foi isso que a 2 Tomatoes Games fez. Só que, segundo eles, todo esse trabalho foi feito sem retorno algum — nem financeiro, nem institucional.
A editora afirma que a Black Box Adventures simplesmente parou de responder, violando os termos do acordo de parceria. E não estamos falando de um e-mail ignorado. Foram meses de silêncio, mesmo com contrato e cronograma em andamento. E se você acha que isso soa familiar, é porque não é a primeira vez: no ano passado, a transmissão holandesa BOOS já havia investigado a BBA, apontando possíveis irregularidades com o uso de verba do Kickstarter.
E é aqui que a coisa fica ainda mais complicada: a 2 Tomatoes decidiu sair do projeto mesmo sem ter sido paga. Isso mostra um compromisso raro com a comunidade — uma tentativa de proteger os consumidores, mesmo às custas de prejuízo próprio. Em vez de seguir alimentando expectativas falsas, eles decidiram comunicar a verdade, doa a quem doer.
E para quem apoiou o projeto esperando uma versão localizada? A recomendação da 2 Tomatoes é clara: procurem diretamente a Black Box Adventures ou o Kickstarter. Ou seja, boa sorte tentando respostas de uma editora que aparentemente desapareceu do mapa.
Uma Jornada de Sonhos… e Muito Dinheiro Envolvido
Se o sumiço editorial já não fosse grave o suficiente, há outra camada de drama nessa história: a gestão de recursos do financiamento coletivo.
Segundo a investigação de Tim Hofman, apresentador da BOOS, a Black Box Adventures arrecadou mais de meio milhão de euros na campanha. Até aí, ok — jogos grandes demandam investimento. Mas o problema veio quando descobriu-se que um dos responsáveis, Bas Demoiseaux, teria transferido cerca de 100 mil euros para sua conta pessoal. O motivo alegado? Uma cláusula contratual que exigiria o pagamento de 5 mil euros mensais caso ele trabalhasse em tempo integral para a empresa.
Só que, segundo Hofman, ele não trabalhava em tempo integral. Dois dias por semana. E ainda assim, sacou muito mais do que o estipulado. A cereja do bolo? A cláusula só se aplicaria em caso de dedicação exclusiva — o que não era o caso. Ou seja, além do silêncio editorial, temos indícios de má gestão (para dizer o mínimo) do dinheiro dos apoiadores.
E quando a editora finalmente se manifesta, diz que está aguardando o fim da tarifa de importação dos EUA para continuar a produção. Uma desculpa plausível? Talvez. Mas difícil de engolir quando o histórico recente mostra desorganização, falta de comunicação e, agora, alegações sérias de uso indevido de verba.
O Que Aprendemos com Essa História: Transparência Não É Opcional
Esse caso levanta discussões importantes sobre o estado atual do financiamento coletivo em jogos de tabuleiro. O Kickstarter é uma ferramenta maravilhosa, que viabiliza projetos autorais incríveis. Mas também é uma faca de dois gumes. Sem fiscalização rigorosa e com promessas exageradas, não são raros os casos de atraso — ou, pior, de desaparecimento de quem deveria entregar.
Como consumidor, eu já apoiei projetos que chegaram antes do prazo e com qualidade excepcional — como Frosthaven ou ISS Vanguard. Mas também já fui vítima de promessas vazias. O problema de Adventures in Neverland não é apenas o atraso: é a quebra de confiança, agravada pelo silêncio, pela falta de prestação de contas e pela recusa em dialogar com os parceiros regionais.
Fica o alerta: é fundamental pesquisar bem antes de apoiar campanhas. Veja o histórico da editora, procure saber se há parcerias de confiança envolvidas, e desconfie quando tudo parece bom demais. Projetos como este reforçam a importância de uma comunidade bem informada — e crítica.
E fica aqui também o reconhecimento à 2 Tomatoes Games, que agiu com transparência e responsabilidade. Num mercado que muitas vezes prioriza o lucro sobre o compromisso, atitudes assim merecem aplausos.
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Olá, eu sou Pedro Henrique Schunz e tenho uma profunda conexão com os jogos de tabuleiro. Desde nossos primeiros encontros com clássicos familiares até as noites emocionantes de partidas estratégicas com amigos, cada dado lançado e cada carta virada moldaram nossa experiência única. Crescemos com os jogos, aprendemos com eles e, ao longo do caminho, construímos memórias inesquecíveis.